17.1.17

MANOEL FIEL FILHO, presente! Agora! E sempre!

Se vivo fosse, o operário metalúrgico Manoel Fiel Filho andaria hoje ainda sob o banho de alegria dos festejos de seus noventa anos, que teria completado no último dia sete, comemorando com a mulher, as filhas, os netos e bisnetos, provavelmente em uma casa modesta na zona leste de São Paulo, onde morou grande parte de sua vida.
Manoel está morto. Foi assassinado, depois de mais de doze horas de tortura, na manhã do dia 17 de janeiro de 1976, em uma cela do famigerado DOI-Codi, um dos centros das barbaridades cometidas pela ditadura militar contra homens e mulheres patriotas, combatentes da pátria, da democracia e da vida.
No ano passado, quando se completaram quarenta anos do crime, realizei o projeto CORRIDA POR MANOEL, fazendo quarenta dias de corrida por percursos que lembravam a vida e a morte do operário assim como outros momentos marcantes da luta contra a ditadura militar.
Hoje voltei a fazer parte daquele percurso, rememorando a trajetória desse homem que, talvez pela vida simples que levava, talvez por uma suposta desimportância de operário, é pouco lembrado.
O que eu tenho a dizer é que cada uma das vítimas da ditadura, cada um dos presos, mortos e desaparecidos é um mártir do povo brasileiro, é um herói da luta pela democracia. Cada um ajudou, com seu sangue, a pavimentar o caminho dos brasileiros para a construção de uma país mais livre e menos desigual –conquistas hoje ameaçadas pelos golpistas que tomaram de assalto o poder e tentam destruir a nação e fazer dos brasileiros escravos.
Tendo esses homens e mulheres como exemplo e inspiração, fiz da minha caminhada de hoje um mergulho na memória, uma homenagem a Manoel.
Segui, primeiro, até o cenário de seu martírio e assassinato. Fui até o prédio na rua Tutoia onde funcionava, em 1976, o DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna), órgão ligado ao Exército, sucedâneo da tenebrosa Operação Bandeirantes.
Hoje ali funciona uma delegacia de polícia, que mostrei em transmissão ao vivo que realizei no início da manhã e reproduzo a seguir.


O vídeo não ficou muito bom, tanto por limitações técnicas do próprio sistema e do aparelho usado para a transmissão, quanto por problemas de Bios (bichinho ignorante operando o sistema).
Em vários pontos o som foge ou fica muito baixo. Isso aconteceu marcadamente em um momento em que lembro outro mártir aniversariante de janeiro, o herói do povo brasileiro Stuart Edgard Angel Jones, nascido em Salvador em onze de janeiro de 1945.


Dirigente do MR-8, Stuart foi assassinado em público, no pátio do quartel da Aeronáutica em que estava detido, no Rio de Janeiro. A ferocidade dos torturadores, que tentavam arrancar dele o paradeiro do capitão Carlos Lamarca, foi em vão.
O martírio de Angel foi relatado em carta do ex-preso político Alex Polari de Alverga à mãe de Stuart, a estilista Zuzu Angel:
Em um momento retiraram o capuz e pude vê-lo sendo espancado depois de descido do pau-de-arara. Antes, à tarde, ouvi durante muito tempo um alvoroço no pátio do CISA. Havia barulho de carros sendo ligados, acelerações, gritos, e uma tosse constante de engasgo e que pude notar que se sucedia sempre às acelerações. Consegui com muito esforço olhar pela janela que ficava a uns dois metros do chão e me deparei com algo difícil de esquecer: junto a um sem número de torturadores, oficiais e soldados, Stuart, já com a pele semi-esfolada, era arrastado de um lado para outro do pátio, amarrado a uma viatura e, de quando em quando, obrigado, com a boca quase colada a uma descarga aberta, a aspirar gases tóxicos que eram expelidos”.
No vídeo, eu me refiro a algumas dessas informações e cometi erros de datas –há discrepância entre diversas fontes. Neste texto, usei os dados registrados pela Comissão Nacional da Verdade.
A lembranças desses casos terríveis pesava na minha caminhada. Decidi, então, seguir para o caminho da vida, da luta, sempre pensando na trajetória de Manoel Fiel Filho.
Fui até a sede do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, onde Manoel militou no início dos anos 1970. Chegou a ser delegado sindical, representante da companheirada que trabalhava com ele na metalúrgica Metal Arte, na zona leste de São Paulo, como lembram os dirigentes sindicais que entrevistei neste vídeo:


De novo, aconteceram alguns problemas técnicos na transmissão, mas me parece que agora o vídeo ficou melhor.
Lembro que, em homenagem a Manoel Fiel Filho, o dia 17 de janeiro, data de sua morte, ficou registrado como o Dia do Delegado Sindical.
VAMO QUE VAMO!!!

PS.: Na manhã de hoje, enquanto rememorava em meu percurso as barbaridades cometidas durante a ditadura militar, um atentado à democracia, à liberdade de expressão e aos direitos humanos mais elementares era cometido em São Paulo. 
A Polícia Militar atacou famílias de sem teto que ocupavam um terreno na zona leste da cidade.


Guilherme Boulos (foto Martha Raque, para os Jornalistas Livres), dirigente do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, foi preso por “desobediência”.
Sobre o caso, reproduzo a seguir texto publicado na página dos Jornalistas Livres:
Boulos acompanhava a ação da Polícia Militar, que chegou com a tropa de choque, na desocupação de uma área que abriga cerca de 700 famílias na Zona Leste de São Paulo.
“Diante da força policial mobilizada, Boulos estava lá para evitar mais um dos constantes massacres às ocupações orquestradas pelo governo de Geraldo Alckmin. Foi detido por  incitação à violência e obstrução da justiça quando, num diálogo pacífico, tentava negociar a transferência das famílias para outro local. Ele também pedia aos oficiais da Justiça prazo – de uma hora e meia – para a desocupação. Há um pedido do Ministério Público para reconsideração do caso, mas os oficiais da Justiça e os policiais não quiseram saber.
“O mandado de despejo foi entregue à comunidade que já ocupa a área há dois anos. Em vez de enfrentar a situação, o poder público entregou o caso para a polícia.
“E, em vez de fazer cadastro das famílias em programas de moradia, o governo foi ao local para destruir as casas de quem não tem onde morar.
Essa é mais ação do Estado para criminalizar os movimentos sociais.”


Percurso do dia 17 de janeiro de 2107
11,21 km percorridos em 2h24min48
Acumulado no projeto 600 aos 60
363,78 km percorridos em 74h10min25
Acumulado no projeto 60 M 60 A

140,57 km percorridos em 27h11min32

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