Não teve
pompa nem circunstância, fanfarra nem banda de música: a primeira maratona de
meu projeto de percorrer, ao longo deste ano, a distância de sessenta maratonas,
passou quase em branco.
Não havia,
no ponto exato da imaginária linha de chegada, nenhum marco importante. Desde o
início de minha caminhada de sábado, sete de janeiro de 2017, fiquei imaginando
onde se daria a passagem dos primeiros 41.195 metros acumulados desde o dia
primeiro de janeiro.
O percurso era
pela avenida Doutor Arnaldo, que homenageia o médico Arnaldo Vieira de
Carvalho, fundador da faculdade de Medica de São Paulo e um entusiasta da
eugenia, que é o movimento que prega a limpeza da raça humana de fatores que a
empobreceriam –a suposta existência desses fatores é uma justificativa para o
racismo.
No primeiro
quilômetro, passaria pelo famoso mercado de flores, que fica em frente ao
cemitério do Araçá. Estava torcendo para que a marca dos 910 metros (quando totalizaria
a distância da primeira maratona) caísse em frente a uma banca bonita,
colorida; ou, pelo menos, em frente a um dos grandes portões de ferro do
cemitério.
Nananina.
Foi num lugar insosso, em frente ao muro do Araçá, onde nem sequer havia uma
pichação qualquer que servisse para identificação do ponto exato de minha
queridíssima primeira maratona. Recentemente caiada, a parede escondia uma
inscrição. Com algum esforço do passante ainda era possível ler, sob a tinta
branca, o grito de protesto amplo, geral e irrestrito, quase desesperado: “Fora
Todos”.
A maioria
dos transeuntes, porém, não chegaria a notar o palavreado. A própria fotografia
mal registra as letras perdidas em uma das camadas do palimpsesto que virou o
muro do Araçá.
Uns trinta
metros além, em direção à avenida Paulista, sim, a parede se somava de peito
aberto às manifestações de parte da população brasileira, afirmando: “Temer
Golpe”.
E, logo à frente,
o muro do Araçá virava tela para a arte urbana, um desenho que sempre me
intriga. É um copo meio cheio de água? Ou é uma boca de fogão montada em
surpreendente plataforma? Alguma coisa há de ser.
Passei pelos
muros que me olhavam, segui pensando nas dores que rondavam meu joelho. Não
pode doer, preciso prosseguir.
E fui, fazendo
desta segunda corrida – de novo, apenas trechinhos de 300 metros intercalados
por caminhadas mais longas—uma incursão à avenida Paulista, desde seu final até
nascimento, no Paraíso.
É muito bom
correr, mesmo que pouquinho. Ainda corro cheio de dúvidas, tateando o
movimento, tentando reaprender a colocar uma perna à frente da outra,
organizando meu corpo, examinando o que faço de errado, sentindo os músculos
acordarem e as engrenagens se mexerem, ainda um tanto enferrujadas.
Queria fazer
do domingo mais um treino, mas obedeci às ordens conservadores de meu fisioterapeuta,
que defende intercalar um dia com corridas com outro de apenas caminhada.
Resolvemos,
então, caminhar jutos, Marcelo Semiatzh e eu. Aproveitamos para discutir todos
os problemas do mundo, sem resolver nenhum; e conversamos também sobre o próprio
ato do caminhar, a importância do andar para o correr.
Ao longo do
caminho, depois de mais de dez quilômetros percorridos, fizemos uma transmissão
ao vivo pela internet apresentando essas discussões. Veja só como foi.
Com o que,
em dois dias, percorri pouco mais de uma meia maratona.
Falta muito,
mais é menos do que faltava no dia primeiro de janeiro.
Vamo que
vamo!
Percurso de
domingo, 8 de janeiro de
2107
11,42 km
percorridos em 2h17min13
Acumulado no
projeto 600 aos 60
285,92 km em
59h14 min23
Acumulado do
projeto 60 M 60 A
62,71 km em
12h15min30
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