O
queniano Paul Kimutai sagrou-se no último domingo bicampeão da Maratona
Internacional de São Paulo, uma das principais provas brasileiras na sua
categoria. Foi seguido por um legítimo filho da terra brasileira, sertanejo
forjado nas dificuldades da vida e lapidado por um construtor de campeões.
Estou
falando do pernambucano EDSON AMARO, a quem tive o prazer de conhecer em 2015,
quando ele ainda embalava sonhos olímpicos. De fato, conseguiu índice para ter
direito a participar da maratona no Rio-2016, mas outros tiveram tempos
melhores.
Agora
ele volta ao estrelato, sempre apoiado pelo técnico MARCIANO BARROS, que tem
uma verdadeira peneira de talentos em Petrolina, em pleno sertão pernambucano –já
descobriu vários campeões, notadamente no atletismo paraolímpico.
“Algumas
pessoas desacreditaram, dei meu melhor e saí com um grande resultado.
Surpreendemos muita gente. Muita gente ficou abismada com nosso potencial”,
disse Amaro depois da prova, com uma ponta de amargura em meio à alegria da
conquista.
Marciano Barros comentou: “Fizemos esse trabalho direcionado para a maratona.
Alguns resultados não muitos bons vieram, mas continuamos trabalhando firme
para chegar aonde chegamos hoje. O objetivo era a Maratona de São Paulo.
Queríamos o título, mas ele não veio. Estamos satisfeitos com a segunda
colocação e por sermos o melhor brasileiro, em uma prova que reuniu os grandes
atletas do Brasil”.
Conheci
os dois, Edson e Marciano, no interiorzão de Pernambuco, na terra crestada de
Santa Maria da Boa Vista, que visitei como parte do projeto MARATONANDO COM OMST. Pois Marciano, além de dirigir a Associação Petrolinense de Atletismo e
dar aulas de educação física, também dá a jovens sem terra iniciação no mundo
do atletismo.
Os
dois chegaram mesmo a participar de uma corrida que organizei na região,
reunindo alunos de escolas rurais de cinco assentamentos localizados ao longo
da Estrada da Reforma Agrária (CLIQUE AQUI PARA CONHECER A HISTÓRIA)
Fiz
com eles amplas entrevistas, publicadas na época na “Folha de S. Paulo” e,
mais tarde, na revista “O2”. Reproduzo a seguir trechos do depoimento de Edson
Amaro, para que você conheça melhor as origens do melhor brasileiro na maratona
de São Paulo.
Fotos Eleonora de Lucena |
“Da
minha mãe, só tive uma irmã, filha do meu pai, só que depois de uma hora de
nascida ela faleceu. Por parte de
pai, tenho 18 irmãs; pela minha mãe, só tenho um irmão. Somos 20 irmãos. Só eu
saí corredor.
“A gente é de família humilde. A gente
morava em uma casa de taipa em Juazeiro da Bahia, próximo à rodoviária. Quando
meu avô morreu, em 1986, quando eu tinha dois anos, minha avó ficou revoltada. Ela
era muito apaixonada por ele, não quis mais viver lá. Vendeu o que tinha, levou
toda a família para São Paulo.
“Eu vinha todo o ano para Juazeiro.
Quando completei 17 anos, não quis mais voltar para São Paulo. Não gostava de
lá porque não tinha liberdade, a gente sai de casa e não sabe se volta...
“Comecei a praticar atletismo na escola
Pedro Raimundo Rego, a mesma em que estudou Daniel Alves. Quem me levou para lá
foi a professora Edileusa, a mesma do Daniel. Depois ela trouxe o treinador
Marciano [Barros], e foi aí que tudo começou.
“Ele me perguntou se eu confiava nele,
disse que eu poderia vir a ser um grande atleta. Eu queria: a gente treinava
duro, três vezes por semana. Conheci José Carlos Santana, tricampeão da
maratona do Rio, medalha de prata no Pan de Havana. Via que estava rodeado de
pessoas que poderiam somar para eu dar uma levantada, subir na vida.
“Era difícil. Eu morava num bairro
muito carente. Perdi muitos amigos para as drogas. Muitas vezes os meninos
chegavam drogados à escola. Às vezes a gente até brigava, cheguei a tomar arma
da mão dos meninos lá na escola.
“A primeira corrida que eu ganhei,
treinando com Marciano, foi um 5.000 m nos Jogos Escolares de Juazeiro. Foi em
2003, quando comecei.
“No meio da turma, eu era o mais
magrinho de todos. Na arquibancada, diziam que eu nem ia conseguir completar.
Ficaram de gozação comigo.
“Na hora da corrida, eu fui passando,
dando volta, dando volta, dando volta, acabei ganhando. Dois dias depois, teve
os 1.500 m e eu ganhei também.
“Quatro dias depois, teve uma corrida
lá em uma cidade chamada Senhor do Bonfim, na Bahia. Tinha muitos atletas bons,
mas Marciano falou que era para eu correr do meu jeito, sem me preocupar com
ninguém.
“Fui o quarto colocado geral da prova,
eram 12 km, e o primeiro na minha categoria, de 15 a 19 anos. Ganhei um troféu
que era quase da minha altura.
“Até hoje eu guardo esse troféu com
carinho lá em casa. Eu vinha dentro do ônibus abraçado com o troféu, 125 km
abraçado com o troféu, que eu nunca tinha ganhado um troféu bonito e grande
daquele jeito.
“Minha primeira maratona foi em 2012,
em Santiago, no Chile, eu estava com medo de correr. Nunca tinha corrido 42
quilômetros.
“Na hora da largada, deu um frio na
barriga. Mesmo assim, completei em
2h16min20. Fui quarto colocado geral na
minha primeira maratona e consegui o índice para os Jogos Olímpicos de Londres.
“Mas a marca que eu fiz ainda era alta
e não dava mais tempo de correr outra prova antes de fechar o período de
classificação. Acabei sendo o quarto melhor brasileiro naquele ano, mas não
pude ir à Olimpíada.
“Depois de Santiago, corri várias
maratonas. Sou bicampeão da Maurício de Nassau, no Recife. Na segunda vez, foi
com chave de ouro: corri dez quilômetros com o grupo e 32 quilômetros sozinho.
“Tem de ter cabeça. Penso só no
treinamento, trabalhando o meu psicológico, concentrando na prova. Tem fotos
minhas em que meus olhos estão vidrados, assim, concentrado. Tudo vem do treinamento: concentração e não
perder o foco.”
VAMO
QUE VAMO!!!
Percurso
do dia 13 de abril de 2017
15,01
km percorridos em 2h05min24
Acumulado no projeto 60M60A
815,78 km percorridos em 149h17min09
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