O pé torcido não me impediu de sair hoje para correr.
Dois dias de repouso foram suficientes para diminuir bastante a dor; ainda que
o pé não esteja completamente recuperado, dá para fazer caminhadas e dar breves
trotes. Ele precisa se regenerar com o movimento.
E minha jornada de hoje foi muito movimentada. Comecei
rodando pela avenida Doutor Arnaldo. Pude observar que os muros do cemitério do
Araçá já recebem pichações contra as mudanças no sistema de aposentadoria que o
governo golpista pretende impor à nação.
Fiquei satisfeito em ver linhas cor-de-rosa anunciando:
“Mulheres contra a Reforma da Previdência!”.
Fica aqui, pois, enquanto corro, uma saudação a essas
mulheres de luta.
Enveredando pela avenida Paulista, passo por barracas
construídas com plástico preto, papelão,
cordão e pedaços de madeira. É o acampamento do Movimento dos Trabalhadores Sem
Teto, instalado em frente à sede da Presidência da República em São Paulo.
O movimento, chamado Ocupa a Paulista, começou na
última quarta-feira (15.2) em grande estilo, com uma enorme passeata reunindo
mais de trinta mil pessoas e comandada por Guilherme Boulos, principal dirigente
do MTST (foto abaixo).
“Se os governantes não vierem falar com a gente,
teremos um novo endereço a partir de hoje: a Avenida Paulista. Ou a gente sai
daqui com resolução, ou a gente vai morar aqui", foi a afirmação de
Boulos.
Trata-se de um protesto contra as modificações feitas
pelo governo golpista no programa de habitação popular. Com as mudanças, foram
prejudicados, no entender do MTST, exatamente os mais necessitados, as famílias
enquadradas na faixa 1, com renda de total de até 1.900 reais, que representam
84% do povo sem casa no Brasil.
"As 600 mil moradias anunciadas por Temer foram
para outra faixa da população. Aumentaram o limite de crédito do Minha Casa
Minha Vida para R$ 9.000,00, ou seja, transformaram um programa social em
programa de crédito imobiliário para financiar casa própria para setores que
não são os mais necessitados, que não são os sem-teto e não são aqueles que
mais precisam de moradia no Brasil", afirma o texto de convocação da
manifestação.
Agora, algumas centenas de pessoas se reúnem no
acampamento, que todos os dias vem recebendo artistas, intelectuais e representantes
de movimento, que fazem shows, dão aulas e participam de rodas de conversa como
forma de apoiar a turma dos sem teto.
Também passei por lá hoje para levar um abraço para o
Boulos, que não tinha chegado ainda.
Em compensação, encontrei um grande amigo,
o militante do MTST e corredor de quatro costados Clayton Veloso, veterano de
várias São Silvestres e um montão de corridas de rua aqui em São Paulo.
Ele estava atuando como uma espécie de segurança na
área do dormitório do acampamento, mas tirou um tempinho para conversar com a
gente e contar um pouco do que rolava no acampamento.
Fiz uma transmissão ao
vivo de nosso bate-papo, que agora está disponível nas redes sociais; para
facilitar, uma cópia pode ser vista a seguir. Clique para assistir ao vídeo.
No vídeo não tive muito tempo para apresentar de forma
mais adequada o meu entrevistado. Aproveito agora para contar um pouco mais
sobre essa figura simpática e dedicada ao movimento.
Eu conheci o Clayton em Taboão da Serra (Grande São
Paulo), no condomínio João Cândido, que
foi o primeiro conjunto habitacional construído diretamente sob a orientação do
MTST.
Os 192 apartamentos do complexo foram entregues pelo
MTST em dezembro de 2014. Na época, conforme registrou a imprensa, Boulos
afirmou que aquela modalidade de obra, supervisionada pelos movimentos
populares, tinha mais qualidade do que os trabalhos de empreitaras contratadas
para o programa Minha Casa, minha Vida:
“Não tenho dúvidas de que quando fazemos algo com
dignidade, as pessoas valorizam. Muita gente diz por aí que, no Minha Casa,
Minha Vida, a turma ganha o apartamento e vende. Quando você joga o cara num
lugar longe, com o apartamento numa caixinha de fósforo, que não cabe nem uma
cama no quarto, é difícil reclamar que ele vá vender. Agora, vamos voltar aqui
daqui a cinco anos e ver se alguém terá vendido. Tenho certeza de que nós vamos
encontrar essas mesmas pessoas aqui, morando nesses apartamentos", disse o
dirigente do MTST.
Tive oportunidade de visitar o conjunto no final do
ano passado, quando começamos os primeiros passos de um projeto novo, que ainda
está embrionário, o MARATONANDO COM O MTST.
Aquecimento pré-caminhada com moradores do cond. João Cândido, do MTST; Clayton está de camiseta do Grêmio (foto Eleonora de Lucena) |
Realizamos diversas reuniões com os moradores, falando
sobre saúde, qualidade de vida, combate ao sedentarismo.
Juntos fizemos várias caminhadas pelo bairro, sempre
com a companhia preciosa do Clayton Veloso e do José Carlos dos Reis, dois
grandes corredores de rua que adotaram a ideia do MARATONANDO COM O MTST e
passaram a coordenar, no condomínio, as caminhadas com a turma.
O Clayton é um pernambucano naturalizado paulista –veio
para cá com seis meses de vida. Nascido em 1981, começou a correr em 2001, mas
já tinha jeito para a coisa: foi graças à sua agilidade que, meses antes,
conseguiu escapar de uma emboscada e evitar saraivada de tiros disparados por
três atacantes.
Passou a treinar, descobriu as corridas de rua, e elas
mudaram sua vida. Na Corrida dos Bombeiros, por exemplo, teve a inspiração de
fazer um curso de salva-vidas, conquistando assim nova profissão.
Zé Carlos, de boné, e Clayton, ao fundo, são corredores que comandam caminhadas com moradores do João Cândido (foto Eleonora de Lucena) |
“Cada corrida é uma história”, me disse
ele depois de uma caminhada que fizemos com moradores do condomínio João
Cândido. E continuou:
“Nessa caminhada que a gente fez agora,
um problema que eu tive ontem, eu fui pensando como solucionar ele hoje. A
gente tem tempo para pensar, tem tempo para refletir, esse tempo que a gente
usou agora, eu particularmente usei para definir uma situação que eu estava em
dúvida. Então a gente consegue se aliviar e pensar duas vezes antes de agir,
tomar qualquer tipo de atitude. A caminhada e a corrida nos proporcionam isso.
Por isso que é bom.”
De fato, não posso deixar de concordar com o Clayton. E desejar a ele e à toda a turma do MTST sucesso nas suas lutas.
VAMO QUE VAMO!!!
Percurso do dia 18 de fevereiro de 2017
10,24 km percorridos em 1h33min04
Acumulado no projeto 60M60A
415,09 km percorridos em 78h37min08
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