Mais ou menos. Às vezes, como nos últimos dias, tiro uma folguinha
da escrita, mas posso garantir que sigo treinando, e os registros de meu relógio
com GPS comprovam minha entrega ao projeto.
Com a força das caminhadas, espero acumular quilômetros
suficientes para permitir que a volta às corridas seja lenta, gradual e segura
para meu fêmur estressado, fraturado, machucado. E que eu possa, de fato,
cumprir os esperados e desejados seiscentos quilômetros até o diade meu
aniversário, em 14 de fevereiro próximo.
De qualquer maneira, sigo falando do povo que, como eu, está por
volta dos sessenta anos.
Mais ou menos. Vez que outra a meninada faz coisas tão
sensacionais que é mister abrir espaço para a garotada aqui na casa dos
veteranos.
É o caso dessa menina casadoira, a Luizinha –ou seria Luizazinha--,
Luizita, a Luiza. Ela vai fazer trinta anos neste 2017 que chega e pretende
então se casar com o amor que vem construindo há anos. E vai festejar correndo.
A corrida, para Luiza, é uma festa. Mas uma festa realizada nos
píncaros da glória, disputando os primeiros lugares, o topo da montanha, a onda
mais longínqua.
No ano passado, Luiza de Franco Tobar, formada em educação física
e especialista em treinamento de triatlo, se tornou a primeira mulher da
história a vencer no geral a etapa da maratona em uma prova de ultra triatlo.
Aliás, por enquanto segue como primeira e única.
Para quem não sabe, e ninguém é obrigado a saber, o ultra triatlo
é um tipo especial de triatlo monstro, com dez quilômetros de natação, 421
quilômetros de ciclismo e uma corrida de dupla maratona, 84,4 quilômetros.
Pois depois das braçadas e das pedaladas, Luiza foi a mais rápida
entre todos os participantes da UB515, homens e mulheres, na etapa maratonística
da prova brasileira, realizada entre Paraty e o Rio de Janeiro.
Trata-se de um fenômeno das longas distâncias, onde em geral os
participantes são mais velhos e mais experientes. Luiza não dá bola para isso:
acaba de se tornar a melhor brasileira no recente Mundial de ultramaratona,
disputado na Espanha na modalidade de cem quilômetros.
A equipa brasileira contou com doze integrantes, oito homens e
quatro mulheres. Trouxeram uma boa colocação: os dois times ficaram em nono
lugar. E Luiza capitaneou a participação nacional na corrida realizada em Los
Alcazares no dia 27 de novembro.
A participação em ultras não é exatamente uma novidade para a
menina –acho que posso chamá-la assim, pois tem metade da minha idade. Ela
começou a correr aos doze anos, incentivada pelo pai; aos 19 anos, ainda
adolescente, fez sua primeira ultramaratona.
Não parou mais. Construiu força e resistência. E sabedoria.
Para participar do Mundial, por exemplo, sabia que não bastavam os
treinos e a preparação que vinha fazendo.
“Fiz um treinamento específico para o Mundial”, me conta ela em
entrevista exclusiva.
Luiza dá mais detalhes da preparação: “Fiz algumas provas de triatlo
até agosto, e uma maratona em julho. Depois de agosto, o foco foi 100% o
Mundial. Fiz uma maratona como treino em 25 de setembro (Foz do Iguaçú), que me
deixou muito satisfeita, não só pelo resultado --sexto lugar geral feminino com
3h08--, mas principalmente pela ausência de dores ou cansaço muscular antes,
durante ou após a prova. Isso indicou que estava no caminho certo e ainda tinha
dois meses para a prova principal”.
Ela ainda se aprimorou mais: “Diminui os treinos de natação e bicicleta
para duas vezes por e aumentei meus treinos de musculação para quatro a cinco
vezes por semana. Ganhei três quilos de massa muscular para a prova”, diz ela,
que é a responsável por seu próprio treinamento.
O problema é que, como diz a lenda, treino é treino e jogo é jogo.
Na hora da corrida, as coisas foram muito diferentes do esperado. E agora paro
de falar para que a Luiza relate com suas próprias palavras aquelas horas
dramáticas, insanas e de muita realização pessoal.
“Larguei na prova controlando bem o ritmo (4'40"/km) e
permaneci nesse ritmo até o km 40, extremamente tranquila. Meu objetivo na
prova era terminar no máximo em 8h30, o que daria uma média de 5'/km.
“Assim que bati no km 40, me surpreendi com dores no quadríceps
(desgaste muscular). Segurei um pouco o ritmo até o km 60. Estava bem ainda.
“Quando bateu o km 60, saí do percurso para ir a um banheiro
químico, pois estava com muita dor de barriga. Foi um alívio; melhorei e
pretendia começar a acelerar de novo o ritmo, porém um quilômetro depois
vomitei.
“Para piorar as coisas, um quilômetro depois começou a chover e a
bater mais frio. Esse foi o momento mais crítico da prova. O chão permaneceu
alagado em diversos pontos até o fim da prova.
“Encontrei um brasileiro homem e o incentivei a ir comigo. Segui
em frente, em um ritmo bem devagar, parei de comer
tudo e permaneci em goles de água para recuperar o estômago.
“Dez quilômetros depois –uma volta completa no percurso--, consegui
tomar um sachê de carboidrato em gel zipvit e nada mais que isso por mais dez
quilômetros, apenas goles de agua.
“Na volta seguinte peguei meu último gel e consegui recuperar o
ritmo. Em cada volta, tive de parar uma vez para ir ao banheiro. A dor de
barriga era forte, mas fiz apenas muito xixi.
“Na última volta, imaginei que conseguiria acelerar de alegria,
mas não aconteceu, pois o percurso estava vazio, quase sem atleta para dar
referência de ritmo. Nos últimos dez quilômetros apenas bebi água, nada de gel
ou comida.
“Consegui acelerar e forçar apenas no último quilômetro, quando
ainda passei uma menina. Terminei em 8h43, 13 minutos acima do meu objetivo.
Mas muito feliz! Cheguei em 32ª mulher geral e a melhor colocação brasileira!
“Foi a primeira vez em que corri cem quilômetros e em que fiz uma
prova com tantas voltas repetidas (odeio). Além disso, o frio e o percurso
plano não são favoráveis para mim. Sou atleta de sol, percurso bastante
ondulado, que sai de um ponto e chega em outro. Logo, o desafio foi muito
grande para mim, porém, foi mais fácil do que imaginei que seria. Permaneci a
prova toda concentrada, e os atletas nos fazem esquecer das voltas.
“Depois
da prova fiquei quarenta minutos' na banheira quente, esperei os outros atletas
da equipe chegarem e fui comer. Depois disso, tem a premiação dos atletas. E
logo às nove 9 e tanto da noite fui prá cama dormir. Estava cansada!”
Bom, acho que a maioria de nós fica cansado só de ouvir a Luiza
contar sua história. Foi épico, especialmente para uma debutante na distância.
Agora, ela vai terminar o ano com muita alegria, já pensando no
casório e na sua comemoração dos trinta anos: vai correr, ao lado de sua irmã
gêmea, a mítica ultramaratona Comrades, na África do Sul. “É meu maior sonho
como ultramaratonista!”
Parabéns à Luiza e à toda equipe brasileira de ultramaratonistas.
VAMO QUE VAMO!!!
PS.: Por algum problema técnico que não consegui resolver, não foi
possível carregar os mapas das atividades dos últimos dias. Fica o registro de
que realizei caminhadas nos dias 18, 19 e 20 (hoje) de dezembro, cada dia
algumas centenas de metros além de seis quilômetros, o que dá um acumulado de
cerca de 18,5 km nestes dias.
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