A dor é inimiga do desempenho, adversária da
satisfação, rival do prazer.
Ao longo de quase dois anos, minha vida de corrida foi
uma vida de dores.
Terminei mancando a maratona de Vancouver, no primeiro
semestre de 2013. Sofria com pontadas nas costas, agulhadas no quadril, cansaço
generalizado e dolorido.
Parei, descansei. Fui me recuperando aos poucos,
fazendo fisioterapia, treinando mal e porcamente, fugindo da planilha preparada
com carinho pelo meu treinador da época. Estava me reforçando, mas tudo muito
lento, às vezes dava vontade de jogar tudo para o alto.
Veio o aniversário de São Paulo, 460 anos em 25 de
janeiro de 2014. Em primeiro de dezembro de 2013, iniciei uma jornada para
homenagear a cidade, prometendo correr um quilômetro em saudação a cada ano de
existência da Pauliceia (leia mais AQUI).
Cinco dias depois, sofri uma fratura por estresse.
Não desisti dos 460 quilômetros, realizando o percurso
em uma sequência de caminhadas, apoiado pelo pessoal do Instituto Vita:
fisioterapia, massagens, acompanhamento médico, orientação. Ao mesmo tempo, eu
passava a ser meu próprio treinador, fazendo o que era possível a cada dia.
Completei com muita alegria o desafio perseguido –veja AQUIum vídeo de balanço da jornada. Mas sobraram sequelas desesperadoras: uma
inflamação em uma vértebra no meio das costas, aumento das já brutais dores na
lombar, agulhamento no miolo do glúteo (o maldito piriforme), sem falar de uma
pontada que assustadoramente chegava até a virilha.
Para piorar, uma enorme inflamação no pé esquerdo, logo
atrás do segundo dedo, como se fosse Neuroma de Morton, mas não era. Inflamação
traiçoeira, que aceita o impacto rápido da corrida, mas derruba quando o pé vem
de prancha na caminhada: só dói quando eu caminho!!!
Ainda por cima, eu envelhecia. Envelhecemos todos, um
pouco a cada dia, mas há momentos que são de virada, de inflexão, de reflexão.
Em setembro de 2014, iniciou-se oficialmente minha aposentadoria, depois de 39
anos de registro em carteira.
Como grande parte dos aposentados brasileiros, segui
trabalhando, não mais registrado, mas fazendo o que me é possível neste
momento. É o que fazemos, nós, os velhinhos ainda produtivos: 39,1% dos
aposentados de 60 a 69 anos continuam trabalhando; quase 16 milhões se mantêm
como arrimo de família, conforme dados do Instituto Data Popular.
Na hora da aposentadoria, muitos de nós paramos para um
balanço. “Agora vou fazer o que sempre quis”, sonham alguns; “estou perdido”,
desesperam-se outros. Entre sonhos perdidos e choque de realidade, muitos de
nós caímos na depressão, ficamos dando voltas sobre nossos próprios quase cadáveres
(é como muitos de nós nos vemos ou imaginamos que a sociedade nos vê).
Resolvi enfrentar isso, como você sabe, colocando como
meta voltar a treinar para uma maratona, fazer minha primeira maratona como
aposentado. Eu, que não vinha fazendo nem dez quilômetros de uma tacada só,
partiria para o maior desafio dos corredores olímpicos, a grande jornada de
42.195 metros.
Tive o apoio luxuoso do já citado Instituto Vita, agora
com o reforço de uma nutricionista. E voltei a receber orientação do pessoal da
Força Dinâmica, grandes estudiosos do movimento humano e cuidados manejadores
de cargas para desafiar o corpo, sem machucá-lo.
Pois o desafio para todos eles –e para mim—era conseguir
aumentar minimamente a quilometragem semanal sem puxar os gatilhos da dor.
Alexandre Blass, o treinador responsável pelas
planilhas e orientação do meu trabalho de força, tratou de criar uma estratégia
de combinação de corrida e caminhada; Graziella Cândido, a fisioterapeuta do
Vita que mais de perto acompanhou todo o meu processo, cuidou de reforçar a musculatura
interior –o dito “core”—e relaxar pontos de tensão ao longo do período de
treinamento. Cito os dois como representantes de todo o grupo envolvido.
O resultado foi estupendo, como você, estimado leitor,
querida leitora deste blog, já sabe (balanço da corrida no quadro abaixo).
Apesar de ter sofrido muito ao longo do
treinamento e de nem sempre ter conseguido cumprir toda a programação feita
pelo treinador, cheguei ao dia da maratona com pelo menos a preparação nos três
últimos meses prévios executada com galhardia.
Cansei na prova, a musculatura endureceu –mas não
travou—e enfrentei comigo mesmo uma batalha de vontades, em que me venci e fui
vitorioso contra mim (a meu favor).
Talvez, se tivéssemos tido mais tempo ou se
eu não estivesse tão fragilizado ao longo de boa parte do período de
treinamento, pudesse ter realizado mais três ou quatro longos. Isso talvez me
permitisse manter por mais tempo a velocidade média dos primeiros 28 km ou 30 km,
fazendo com que eu completasse em menos de cinco horas.
Não dá para saber.
O que dá para saber é que, com o
treinamento feito, com uma quilometragem mínima de corridas, é possível
enfrentar a distância com um grau suportável de sofrimento, que não chega a ser
dor de alguma patologia, apenas o sofrimento muscular normal do cansaço e da
sobrecarga.
O que nós fizemos foi muito simples (mas só pôde ser
feito graças aos profundos conhecimentos técnicos do Alexandre). TODOS os
treinos de corrida foram feitos em blocos que combinavam corrida e caminhada (abaixo, balanço geral do processo).
Os blocos variavam conforme o dia da semana, conforme a
distância máxima desejada, conforme a semana de treinamento e a proximidade com
a data da prova, conforme minhas dores ou minha condição mais positiva.
Recebi
planilhas semanais. Não poucas vezes, elas foram modificadas durante a semana
em curso para se adaptar às minhas condições específicas daquela semana (em
geral, negativas; mas também houve semanas em que pedi mais treino e fui
atendido).
Fizemos blocos de 1.800 metros de corrida por 200 de
caminhada (como fiz hoje, a primeira vez que corri desde a maratona), outros de
300 de caminhada por 3.700 de corrida, e até de 500 metros de caminhada por
4.500 metros de corrida.
No total, foram 73 treinos registrados pelo meu
relógico com GPS. A quilometragem acumulada, entre caminhadas e corridas,
chegou a 780 km –como fiz vários treinos de caminhada sem registro, estimo que,
no total geral mesmo tenho sido de 80 a 85 jornadas, com cerca de 850
quilômetros percorridos.
Nesses cinco meses (quatro meses e meio) de treino, a
partir de fevereiro, houve um crescendo da quilometragem mensal. Mesmo assim,
como você pode ver no quadro abaixo, não é nada que deixe maratonistas experientes
abismados; ao contrário: é muito bom ver que quilometragem tão baixa permitiu
chegar a um resultado tão positivo.
O segredo talvez esteja na sábia manipulação dos
volumes e das cargas semanais, que não foram crescentes, mas sim variadas:
cresce uma ou duas semanas, cai, volta a crescer, estabiliza, cai novamente,
sobe e assim vai.
O balanço das cargas semana a semana é esclarecedor.
Como dá para perceber, meu ritmo médio geral,
considerando todos os treinos, foi de sete minutos e meio por quilômetro
(7,5min/km). Isso é o balanço total, misturando treinos de corrida e caminhada,
resultados de provas, jornadas de apenas caminhada etc.; e, para surpresa de
ninguém, foi quase exatamente o ritmo empregado na prova.
Pelos dados do meu GPS, aliás, minha média foi um
pouquinho mais rápida do que a dos treinos: 7,3min/km. Ele considera que a
distância que percorri (talvez por idas e vindas ou por não respeitar
exatamente o trajeto ideal traçado pelos organizadores) foi de 42,6 km (não
42,195 km).
Com este balanço, concluo o projeto PRIMEIRA MARATONA
COMO APOSENTADO. Mas não paro com meus desafios.
Este blog continuará vivo e atento a tudo o que envolve
a vida, o trabalho e a política do povo da Terceira Idade, os veteranos, os
aposentados, os velhinhos, nóis tudo que tamo aqui. Estou planejando, com meus
apoiadores, o desenho de um novo projeto.
Desde já, agradeço ao Vita e à Força Dinâmica pela
companhia nesta jornada e pelo incentivo para o que vem por aí.
Vai ser muito bacana, espero que seja também
inspirador. Vai ser difícil e caro. Portanto, querida leitora, estimado leitor,
se você conhecer empresas ou entidades que estejam dispostas a apoiar a jornada
de um aposentado pela vida, contra a depressão, pelo trabalho, contra a doença,
pelo prazer e pela alegria, pode me apresentar a eles.
Estamos abertos para conversar sobre diversas formas de
apoio para um projeto que, espero, você venha a gostar muito e a apoiar ainda
mais do que apoiou esta jornada que ora se conclui.
Muito obrigado por tudo. Fique comigo, acompanhe as
novas mensagens que colocarei aqui e não deixe de curtir minha página no
Facebook. Clique AQUI para chegar até ela, compartilhe, divulgue.
Vamo que vamo!!!
Agora é já, depois é mais tarde!!!!
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