30.11.15

Governo do Quênia quer saída de cartolas da federação de atletismo

O governo do Quênia pediu a demissão dos principais dirigentes da federação de atletismo do país depois que um grupo de atletas ocupou a sede da entidade em protesto contra o que consideram corrupção generaliza e falta de ação contra o doping.

“Estou muito orgulhoso da decisão dos atletas”, disse em entrevista a este repórter o jornalista e escritor britânico Adharanand Finn, autor do premiado livro “Running with de Kenyans” (Correndo com os quenianos).

Segundo ele, “é preciso muita coragem para enfrentar a federação, pois há muita corrupção e ela pode punir os atletas”.

Ao que parece, porém, são os cartolas que correm o risco de punição no atual momento.

A entidade é acusada de corrupção; executivos teriam metida a mão no dinheiro de um contrato de patrocínio com a Nike. Além disso, a federação também seria conivente com esquemas de dopagem, deixando de investigar e punir redes organizadas para fraudar competições.

O Ministério do Esporte do país pediu a renúncia dos executivos envolvidos em acusações, pelo menos enquanto durarem as investigações dos casos.

Alguns dos chefões já tiveram de responder a inquérito policial, como o ex-eterno presidente Isaiah Kiplagat (que se licenciou para concorrer à IAAF, o vice-presidente David Okeyo e o ex-tesoureiro da federação Joseph Kinyua. Todos eles disseram ser inocentes.

Nos meios esportivos, porém, a credibilidade deles está bem abalada. Recentemente, Dick Pound, coordenador da comissão de investigação que escancarou a dopagem generalizada na Rússia, disse: “O doping no Quênia é preocupante”.

O país continua na mira das autoridades internacionais antidopagem, que suspeitam da existência de poderosos esquemas funcionando sob o olhar complacente da cartolagem local.

Não é o que pensa o jornalista britânico com quem eu conversei por e-mail. A entrevista com Finn serviu de base para reportagem publicada na Folha neste último domingo (confira aqui)

Agora, com exclusividade para os leitores deste blog, trago a íntegra da entrevista com Finn. Para escrever seu livro, viveu seis meses na Meca queniana das corridas de longa distância, entrevistou dezenas de atletas e consultou pesquisas e especialistas em esporte.

Britânico Finn corre com quenianos em 2011,
quando viveu no país  - foto Arquivo Pessoal
Baseado no seu conhecimento, o senhor diria que há doping generalizado no Quênia?
Claramente há doping, sim, mas não acredito que seja tão organizado e amplo como é na Rússia.

De acordo com seu livro, os bons resultados dos quenianos são fruto de treinamento duro. Com as recentes denúncias de doping, o senhor se sente enganado?
Não. Eu ainda acredito que a maioria dos corredores do Quênia é limpa. Não sei quantos estão se dopando, mas sei que alguns dos principais corredores são limpos, com certeza. A história da corrida no Quênia não é uma mentira –sua incrível dominação na corrida de longa distância não foi construída com base no doping.

Lamento, no entanto, pelos corredores quenianos honestos. O fato de que alguns corredores do Quênia estão se dopando coloca todos eles sob suspeita. Em qualquer lugar em que um queniano tenha um bom resultado poderão pensar que ele ou ele correu sob doping. Isso é uma vergonha para os corredores limpos, que trabalham duro para conseguir seus resultados.

Qual sua opinião sobre as acusações que pesam sobre a Federação de Atletismo do Quênia(AK)?
A Federação do Quênia está no coreção de todos os problemas. Eles  se mostraram inúteis no combate ao doping e parece que também andaram roubando. A entidade sempre esteve longe dos atletas, e me senti muito orgulhoso dos atletas que fizeram a ocupação, defendendo suas próprias bandeiras. Foi uma atitude muito corajosa, porque a federação é muito corrupta e pode punir os atletas que se levantam contra ela.

No seu livro, o senhor afirma que as razões do sucesso queniano combinam biologia, história, economia e treinamento duro. Se eles são tão bons, por que o doping?
A competição no Quênia é tão dura que pode ser difícil até mesmo conseguir vaga em uma corrida. Eu acredito que os corredores que estão se dopando, em sua maioria, são aquelas que não estão se saindo bem. Ficam tão desesperados para conseguir uma corrida, para fazer algo em suas carreiras, que recorrem ao doping. Os corredores do primeiro time costumam ficar satisfeitos com seus resultados, mesmo quando chegam em segundo ou no terceiro lugar. Na minha opinião, eles não são tão fanáticos por ganhar sempre, como, por exemplo, Lance Armstrong.


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