21.8.15

Aos 55 anos, secretária treina para sua primeira maratona


Nair Rocha de Oliveira é uma simpática senhora de cabelos curtos e corpo miúdo –tem um metro e meio e pouco mais de 50 quilos.
Eu a conheci nas sala de exercícios da Força Dinâmica  --empresa que combina preparação técnica e física e orientação biomecânica—quando ela vivia agitada na expectativa de fazer sua primeira meia maratona.
O tempo passou e as meias maratonas também.
Hoje a paulista nascida em Pacaembu, que trabalha de sol a sol como secretária em uma clínica médica,  está na reta final dos treinos para sua estreia na distância completa –o debute será em Berlim.
A prova será também uma comemoração de sua vida de atleta: começou a correr há dez anos, quando tinha 45.
Enquanto se prepara, Nair dedicou um pouquinho de seu tempo para responder a algumas perguntas sobre a experiência. E sobre o fato de, como nós outros daqui, praticar atividade física intensa numa idade em que muitos preferem apenas movimentar os botões do controle remoto do televisor.
  
Nair durante a meia maratona de Paris -- Foto Arquivo Pessoal

Como lhe surgiu a ideia de fazer uma maratona?
Quando comecei correr, entrei numa equipe de corrida e alguns meses depois um grupo de corredores mais antigos da equipe começaram treinar para a maratona de Paris. Acompanhei todos os preparativos e a expectativa  para a viagem e a prova. Foi muito legal. Já estava gostando de correr e acho que foi ali que começou meu sonho de fazer uma maratona no exterior.

O que correr 42.195 metros sem parar pode ter de bom?
Não só a prova, mas toda a preparação e os treinos para a maratona já trazem muitas coisas boas.  Estou mais focada em todas as minhas atividades, pois tenho que administrar melhor o meu tempo, estou mais disciplinada, cuidando muito bem da minha saúde.
Em certa medida, os treinos já são uma prova. Alguns são muito bons, outros nem tanto, mas sempre que termina é mais uma vitória. No dia que terminei o meu treino mais longo (36 km), fiquei emocionada, era um sábado chuvoso, terminei lá pelas 10h30, não tinha quase mais ninguém na USP, estava sozinha, comemorei como se estivesse completando a prova.

Quais são os riscos da maratona?
Sei que há riscos. Posso lesões importantes, que me impeçam de continuar correndo ou encurtem a minha vida de corredora. Tenho me preparado com muito cuidado, não só agora, mas desde que comecei fazer meias maratonas.
Tenho uma boa orientação técnica e nutricional e, acima de tudo, respeito meus limites; procuro fazer com que tudo seja prazeroso, não só as provas, como os treinos. Não estou preocupada em diminuir meu tempo, gosto de correr num ritmo confortável e curtir a corrida.
No começo pensava no risco cardíaco, mas agora estou vendo que meu coração está cada vez melhor.

Por que escolheu a maratona de Berlim para sua estreia?
Quando comentei  com meu treinador que gostaria de fazer minha primeira maratona no exterior, ele, muito sensato,  me aconselhou fazer primeiro uma aqui no Brasil, pois seria mais tranquilo, não teria tanta expectativa.
Mas aí eu pensei que não sabia se conseguiria fazer mais que uma, então melhor fazer logo uma bem bacana. Poderia ser Paris, mas achei que Berlim também seria uma boa opção por ser considerada uma prova totalmente plana, com temperatura boa  e muito bem organizada.
No ano passado estive em Berlim uma semana antes da maratona, já percebi um pouco o "clima" e adorei a cidade, bonita, moderna, muito fácil para se locomover. Fiz a pré-inscrição em novembro e em janeiro recebi o email informando que eu havia sido sorteada, aí não teve mais jeito...

Por que a senhora começou a correr?
Eu fumei dos 17 aos 30 aos. Quando parei de fumar, tentei começar a correr mas detestei, achei muito chato  mesmo.
Também naquela época não existia esta "cultura da corrida", não tinha essa profusão de assessorias nem tantas provas.
Além disso, por ironia do destino, eu estava toda animada e comprei um livro sobre corrida, de um corredor chamado James Fix.
Um dia depois de ter comprado o livro, vi numa banca de jornal uma revista com uma matéria de capa que dizia mais ou menos o seguinte: "Correr não é tão bom como se pensa,  o corredor James Fix morreu de um ataque cardíaco aos 50 anos..."
Bom, aí acabou de vez meu entusiasmo pela corrida.
Fui fazer outras atividades, me matriculei numa escola de natação e gostei muito de nadar. Depois de algum tempo, iniciei também aulas de dança de salão, que na época (1994/1995) estava em alta. A dança de salão também foi algo muito bom na minha vida, conheci muita gente legal, amizades que cultivo até hoje.
Depois de muito tempo nadando em escolas de natação e depois no Sesc, resolvi ficar sócia de um clube para ter mais liberdade para nadar. Quando fiquei sócia do tal, clube a piscina foi fechada para reforma! Enquanto a piscina não abria, comecei a caminhar e fazer musculação. Nessa época estava lendo o livro do Nuno Cobra e foi o que me impusionou a dar os primeiros passos na corrida.
Nunca vou me esquecer, comecei correndo 200 m na pista de Cooper do Ibirapuera e aí fui aumentando cada semana 100 m até o dia que completei 1.200 m correndo. Assim fui indo até chegar aos 3.000 m, quando descobri que no clube havia uma equipe de corrida.
Comecei meio relutante, pois ainda fazia dança de salão e saía à noite para dançar, ficava muito difícil levantar cedo para correr. Mas, com o tempo, fui gostando muito da corrida, também conheci muita gente interessante e acabei trocando a natação e a dança pela corrida.

Hoje como é sua preparação?
Meu treino é bem equilibrado, tem sempre um pouco de caminhada no começo e no fim. Nos treinos longos, há intervalos de 200/300 m de caminhada a cada 5 km mais ou menos. Treino corrida três vezes por semana, um dia de caminhada e dois dias de treino de força, sempre de manhã. No domingo descanso.

Há outros trabalhos de reforço físico?
Faço trabalho de força específico, com orientação para melhorar a postura na corrida e prevenir lesões.
Sempre tive hábitos alimentares saudáveis, isso já vem da minha educação. Agora tenho orientação nutricional para suprir melhor as necessidades do corpo com a atividade física, mas nada muito especial, apenas um equilíbrio melhor. Naturalmente como bastante verdura, frutas, alimentos integrais, carnes magras, pouca gordura, como doce e chocolate com moderação (às vezes a gente dá uma escorregada), gosto de tomar vinho e cerveja, geralmente no final de semana.


Qual foi sua primeira corrida de rua?
Minha primeira prova não foi uma experiência muito legal, foi a Maratona de Revezamento do Pão de Açúcar. Fui uma das últimas corredoras da equipe, mas, como havia chegado cedo, tive que esperar muito para correr, foi bem chato.
Acho que a primeira corrida que curti bastante mesmo foi os 10 km do Graac, que é uma prova que tem um astral muito legal. Outra que também foi uma das primeiras e marcou muito foi a do Centro Histórico, adoro correr pelo centro da cidade.

Qual é sua melhor lembrança de uma corrida de rua?
Geralmente as boas lembranças estão relacionadas a  boas provas,  lugares bonitos e boa preparação. Na meia maratona do Rio, quando a gente chega  no topo da subida e avista toda a orla, é um deslumbramento, aquela vista maravilhosa, aí você pensa: lá vou eu...que delícia! Outras boas lembranças  foram na meia das cataratas e na de Budapeste, tanto por estar me sentindo muito bem como pela paisagem.

E a pior?
As piores lembranças geralmente estão relacionadas a provas mal organizadas e percursos ruins. Os 25 km da Maratona de São Paulo,se não me engano em  2013, foi uma das piores, principalmente o final da prova que foi uma desorganização total. Jurei que jamais faria uma maratona aqui em São Paulo, o que é uma pena...

A senhora já passou dos 50 anos. Não é hora de parar?
De jeito nenhum, acho que agora é o melhor momento.
Já me aposentei, mas ainda continuo trabalhando. Espero poder diminuir um pouco o rítmo de trabalho para ter mais tempo para correr e fazer outras coisas.
O problema é que a gente precisa de dinheiro, afinal correr não é uma atividade tão barata quanto se pensa, ainda mais quando se quer correr no exterior. Só com a aposentadoria hoje não é possível.

O que o exercício traz de bom para veteranos como nós?
Traz vitalidade, entusiasmo, a qualidade do sono é muito melhor quando praticamos atividade física.
Correr é muito bom, mas nem todo mundo gosta ou se adapta. Acho bom que as pessoas pratiquem atividade física de uma maneira geral.
Caminhar e correr é mais fácil, pois  pode ser praticado em qualquer lugar, porém é preciso tomar cuidado, não dá prá começar a correr de uma  hora prá outra, é preciso ir devagar, ter paciência. Isso é bom, pois as pessoas mais velhas geralmente já aprenderam ser mais pacientes.

Quais os benefícios específicos da corrida?
Traz uma sensação de bem estar, disposição, um cansaço bom, que faz a gente dormir muito bem. Outra coisa muito legal é que a corrida em si é um momento muito bom para refletir, estar com a gente mesmo, fazer planos. É gostoso também correr com os amigos, mas na maioria das vezes corro sozinha.

A corrida rejuvesce?
É muito comum ouvir que a corrida deixa as pessoas com aparência mais envelhecida, por causa da exposição ao sol, perda de líquido, do imapcto, etc...De fato, a corrida é bastante desgastante para o corpo, principalmente para nós que vivemos num clima quente e  numa cidade tão poluída, como São Paulo. Ë preciso muita hidratação e protetor solar, além dos outros cuidados com alimentação e treinos adequados.
Um conselho interessante de uma dermatologista, além de todos os cuidados, é prestar atenção nas caretas que gente faz enquanto corre.

Por outro lado, o bem estar e a energia que  sentimos com a corrida rejuvenescem e compensam muito este desgaste físico, a gente fica mais feliz. 

12.8.15

Aos 98 anos, brasileiro Frederico Fischer é prata nos 100 m no Mundial de veteranos

Até quando a gente pode correr, saltar, lançar, arremessar? Com que idade ficamos velhos? Um bando de homens e mulheres está se encarregando de desafiar ideias preconcebidas, disputando na cidade francesa de Lyon o Mundial de atletismo para veteranos.

Dá uma inveja!!!

É sensacional acompanhar os resultados de pessoas que já passaram dos 80, dos 90, dos 95. Não são mais crianças, não têm a força da juventude, mas têm determinação inquebrantável e servem de exemplo para qualquer um.

A delegação brasileira está tendo um desempenho sensacional, que deveria servir de exemplo e iluminação para os dirigentes esportivos de nossas modalidades olímpicas.

No quadro de medalhas, o Brasil aparece em 19 pódios (pelo que vi, porém, está desatualizado e já há mais uma medalha verde-amarela). O país contabiliza nada menos do que seis campeões mundiais.

Um deles é o meu amigo, entrevistado e perfilado em meu livro “+Corrida” Frederico Fischer (foto Fernando Donasci).



Do alto de seus 98 anos, lançou o martelo a 16,62 m para conquistar o ouro na categoria de maiores de 95 anos (M95). No arremesso de disco, ficou em segundo, com 13,21 m (perdeu para um austríaco três anos mais jovem).

Mas o que me impressiona mesmo em Fischer é a inabalável decisão de continuar treinando corrida n as areais de Peruíbe. Faz “tiros” de 50 metros, intercala com caminhada, começa tudo de novo, depois de alguns alongamentos. Também realiza trabalhos de força.

Vale a pena: é o recordista mundial dos 100 m entre os maiores de 90 anos (M90) e os maiores de 95 (M95). Neste mundial, conquistou a prata na distância, que completou em 24s89, apenas um segundo e 39 centésimos atrás do britânico que levou o ouro e tem dois anos a menos.

Não é à toa que Fischer diz: "Não é só bocha e truco que o idoso deve fazer. Tem é que se movimentar mesmo. E outra: sentir cansaço. Não é começou a cansar e parar. Tem de forçar um pouco mais".

Ele deu essa receita em entrevista que me concedeu há seis anos e resultou em uma reportagem na Folha que você pode ler clicando AQUI. A transcrição (quase) integral de nossa conversa –e também de uma longa entrevista com outro veteraníssimo brasileiro, o “seu” Toniquinho—você pode ler em meu blog, clicando AQUI –tem de rolar a página até chegar ao texto desejado.

Ainda que Fischer seja talvez a estrela mais brilhante da delegação verde-amarela, temos outros grandes atletas na turma dos superveteranos.

Recordista mundial nos 100 m e nos 200 m, categoria maiores de 85 anos (M85), Yoshiyuki Shimizu conquistou neste Mundial o ouro nas duas distâncias. Aos 87 anos, traz também o primeiro lugar no salto triplo!!

E uma senhora de 84 anos de mesmo sobrenome –esposa dele, talvez, não consegui confirmar--, dona Mitsu Hotsumi Shimizu, traz o bronze para o Brasil nos 100 m para mulheres de mais de 80 anos (W80).

Falando em mulheres dessa faixa etária, há que tirar o chapéu para Margarida Hochstatter, que conquistou a prata nos 5.000 m, com impressionantes 31min30s99 (ainda que eu não seja parâmetro para nada, adianta que hoje não consigo nem chegar perto disso)

Dona Margarida também foi prata nos 10.000 m, com 1h04min39s93. E ainda pegou um bronze na distância intermediário de 8.000 m (prova não olímpica), com 55min16.
Nessa distância, aliás, outro brasileira também brilhou: Marisa Cruz, 71, trouxe o bronze na categoria maiores de 70 (W70) –mesmo posto que obteve nos 10.000 m, completados em 52min02s65!!!!

Volto à homarada para destacar os resultados do senhor Mamoru Ussami, que representou o Brasil na categoria maiores de 90 anos: traz o ouro nos 200 m e a prata nos 100 m.

Infelizmente, não dá para citar todo mundo. Mas prometo que vou atrás de alguns desses nomes e de outros competidores brasileiros; pretendo trazer várias entrevistas para você.

Enquanto isso, fique ligado no Mundial de veteranos (osite oficial está AQUI). Domingo, dia 16, será realizado o Mundial de maratona para maiores de 35 anos, homens e mulheres.

Assim que tiver dados disponíveis, conto tudinho para você.