20.12.16

Vomitando e com dor de barriga, Luiza Tobar é a melhor brasileira no Mundial de 100 km

Todo santo dia, faça chuva ou faça sol, venho aqui contar histórias de velhos.
Mais ou menos. Às vezes, como nos últimos dias, tiro uma folguinha da escrita, mas posso garantir que sigo treinando, e os registros de meu relógio com GPS comprovam minha entrega ao projeto.
Com a força das caminhadas, espero acumular quilômetros suficientes para permitir que a volta às corridas seja lenta, gradual e segura para meu fêmur estressado, fraturado, machucado. E que eu possa, de fato, cumprir os esperados e desejados seiscentos quilômetros até o diade meu aniversário, em 14 de fevereiro próximo.
De qualquer maneira, sigo falando do povo que, como eu, está por volta dos sessenta anos.
Mais ou menos. Vez que outra a meninada faz coisas tão sensacionais que é mister abrir espaço para a garotada aqui na casa dos veteranos.
É o caso dessa menina casadoira, a Luizinha –ou seria Luizazinha--, Luizita, a Luiza. Ela vai fazer trinta anos neste 2017 que chega e pretende então se casar com o amor que vem construindo há anos. E vai festejar correndo.
A corrida, para Luiza, é uma festa. Mas uma festa realizada nos píncaros da glória, disputando os primeiros lugares, o topo da montanha, a onda mais longínqua.
No ano passado, Luiza de Franco Tobar, formada em educação física e especialista em treinamento de triatlo, se tornou a primeira mulher da história a vencer no geral a etapa da maratona em uma prova de ultra triatlo. Aliás, por enquanto segue como primeira e única.
Para quem não sabe, e ninguém é obrigado a saber, o ultra triatlo é um tipo especial de triatlo monstro, com dez quilômetros de natação, 421 quilômetros de ciclismo e uma corrida de dupla maratona, 84,4 quilômetros.
Pois depois das braçadas e das pedaladas, Luiza foi a mais rápida entre todos os participantes da UB515, homens e mulheres, na etapa maratonística da prova brasileira, realizada entre Paraty e o Rio de Janeiro.
Trata-se de um fenômeno das longas distâncias, onde em geral os participantes são mais velhos e mais experientes. Luiza não dá bola para isso: acaba de se tornar a melhor brasileira no recente Mundial de ultramaratona, disputado na Espanha na modalidade de cem quilômetros.
A equipa brasileira contou com doze integrantes, oito homens e quatro mulheres. Trouxeram uma boa colocação: os dois times ficaram em nono lugar. E Luiza capitaneou a participação nacional na corrida realizada em Los Alcazares no dia 27 de novembro.
A participação em ultras não é exatamente uma novidade para a menina –acho que posso chamá-la assim, pois tem metade da minha idade. Ela começou a correr aos doze anos, incentivada pelo pai; aos 19 anos, ainda adolescente, fez sua primeira ultramaratona.
Não parou mais. Construiu força e resistência. E sabedoria.
Para participar do Mundial, por exemplo, sabia que não bastavam os treinos e a preparação que vinha fazendo.
“Fiz um treinamento específico para o Mundial”, me conta ela em entrevista exclusiva.
Luiza dá mais detalhes da preparação: “Fiz algumas provas de triatlo até agosto, e uma maratona em julho. Depois de agosto, o foco foi 100% o Mundial. Fiz uma maratona como treino em 25 de setembro (Foz do Iguaçú), que me deixou muito satisfeita, não só pelo resultado --sexto lugar geral feminino com 3h08--, mas principalmente pela ausência de dores ou cansaço muscular antes, durante ou após a prova. Isso indicou que estava no caminho certo e ainda tinha dois meses para a prova principal”.
Ela ainda se aprimorou mais: “Diminui os treinos de natação e bicicleta para duas vezes por e aumentei meus treinos de musculação para quatro a cinco vezes por semana. Ganhei três quilos de massa muscular para a prova”, diz ela, que é a responsável por seu próprio treinamento.
O problema é que, como diz a lenda, treino é treino e jogo é jogo. Na hora da corrida, as coisas foram muito diferentes do esperado. E agora paro de falar para que a Luiza relate com suas próprias palavras aquelas horas dramáticas, insanas e de muita realização pessoal.

“Larguei na prova controlando bem o ritmo (4'40"/km) e permaneci nesse ritmo até o km 40, extremamente tranquila. Meu objetivo na prova era terminar no máximo em 8h30, o que daria uma média de 5'/km.
“Assim que bati no km 40, me surpreendi com dores no quadríceps (desgaste muscular). Segurei um pouco o ritmo até o km 60. Estava bem ainda.
“Quando bateu o km 60, saí do percurso para ir a um banheiro químico, pois estava com muita dor de barriga. Foi um alívio; melhorei e pretendia começar a acelerar de novo o ritmo, porém um quilômetro depois vomitei.
“Para piorar as coisas, um quilômetro depois começou a chover e a bater mais frio. Esse foi o momento mais crítico da prova. O chão permaneceu alagado em diversos pontos até o fim da prova. 
“Encontrei um brasileiro homem e o incentivei a ir comigo. Segui em frente, em um ritmo bem devagar, parei de comer tudo e permaneci em goles de água para recuperar o estômago.
“Dez quilômetros depois –uma volta completa no percurso--, consegui tomar um sachê de carboidrato em gel zipvit e nada mais que isso por mais dez quilômetros, apenas goles de agua.
“Na volta seguinte peguei meu último gel e consegui recuperar o ritmo. Em cada volta, tive de parar uma vez para ir ao banheiro. A dor de barriga era forte, mas fiz apenas muito xixi.
“Na última volta, imaginei que conseguiria acelerar de alegria, mas não aconteceu, pois o percurso estava vazio, quase sem atleta para dar referência de ritmo. Nos últimos dez quilômetros apenas bebi água, nada de gel ou comida.
“Consegui acelerar e forçar apenas no último quilômetro, quando ainda passei uma menina. Terminei em 8h43, 13 minutos acima do meu objetivo. Mas muito feliz! Cheguei em 32ª mulher geral e a melhor colocação brasileira!
“Foi a primeira vez em que corri cem quilômetros e em que fiz uma prova com tantas voltas repetidas (odeio). Além disso, o frio e o percurso plano não são favoráveis para mim. Sou atleta de sol, percurso bastante ondulado, que sai de um ponto e chega em outro. Logo, o desafio foi muito grande para mim, porém, foi mais fácil do que imaginei que seria. Permaneci a prova toda concentrada, e os atletas nos fazem esquecer das voltas.
“Depois da prova fiquei quarenta minutos' na banheira quente, esperei os outros atletas da equipe chegarem e fui comer. Depois disso, tem a premiação dos atletas. E logo às nove 9 e tanto da noite fui prá cama dormir. Estava cansada!”
Bom, acho que a maioria de nós fica cansado só de ouvir a Luiza contar sua história. Foi épico, especialmente para uma debutante na distância.
Agora, ela vai terminar o ano com muita alegria, já pensando no casório e na sua comemoração dos trinta anos: vai correr, ao lado de sua irmã gêmea, a mítica ultramaratona Comrades, na África do Sul. “É meu maior sonho como ultramaratonista!”
Parabéns à Luiza e à toda equipe brasileira de ultramaratonistas.
VAMO QUE VAMO!!!
PS.: Por algum problema técnico que não consegui resolver, não foi possível carregar os mapas das atividades dos últimos dias. Fica o registro de que realizei caminhadas nos dias 18, 19 e 20 (hoje) de dezembro, cada dia algumas centenas de metros além de seis quilômetros, o que dá um acumulado de cerca de 18,5 km nestes dias.



16.12.16

Caminhada relembra mortos na Chacina da Lapa, que faz 40 anos

A minha caminhada de hoje foi um mergulho na memória, na história das lutas democráticas em nosso país. Com Eleonora, minha companheira de vida, e Ana Claudia, dos Corredores Patriotas Contra o Golpe, segui na direção da Lapa, na zona oeste da cidade, onde há quarenta anos foram assassinados Ângelo Arroyo e Pedro Pomar, dirigentes do Partido Comunista do Brasil.
Com tiros de metralhadoras e fuzis, pistolas e revólveres, numa fuzilaria desvairada, a execução se deu quando o Exército invadiu uma casinha branca na rua Pio XI, 767, onde tinha sido realizada uma reunião do Comitê Central do PCdoB. A única sobrevivente do ataque foi Maria Trindade, militante do partido que trabalhara como cozinheira durante a reunião.
A reunião tinha terminado no dia anterior. Desde o início da noite do dia 15, um velho corcel azul fizera várias viagens para devolver à cidade os participantes do encontro clandestino, realizado no final de um ano marcado pelo assassinato sob tortura do operário Manoel Fiel Filho.
O que os comunistas não sabiam era que a repressão estava de campana, acompanhando todos os movimentos. E os militantes foram sendo presos, um a um.
A reunião tinha “caído” porque um dos dirigentes comunistas se transformara em informante das forças da repressão. 
Aldo Arantes, um dos sobreviventes da reunião realizada na rua Pio XI em dezembro de 1976
“Havia um traidor, Jover Telles. Foi ele quem dedou”, me disse um dos sobreviventes da reunião, Aldo Arantes, que encontrei na última terça-feira em cerimônia memorial realizada na Câmara de Vereadores de São Paulo.
“Quando houve a traição, o Exército ficou sabendo da casa com antecedência, cercou toda a casa, permaneceu cercando a casa durante todos os dias em que nós fizemos a reunião”, diz Haroldo de Lima, com quem também conversei na cerimônia realizada na Câmara.
Ele segue: “Quando terminou a reunião, eles sabiam, o traidor contou para eles, o mecanismo pelo qual se faria a dispersão. Eles sabiam que os participantes iriam sair dois a dois no carro. A proporção que iam saindo, saiu os primeiros dois, eles prendiam, depois saía a segunda dupla, eles prendiam. E o cabra do carro sempre voltava achando que não tinha acontecido nada porque a prisão acontecia depois, os militantes eram seguidos e presos”, diz Haroldo de Lima, hoje com 77 anos.
A reunião começara alguns dias antes.
“A reunião do Comitê Central foi antecedida por uma reunião da comissão política. Estávamos todos lá, nessa casa na rua Pio XI, que era onde a gente se reunia. O João Amazonas morava lá. E a gente fazia reuniões lá. Nessa reunião discutimos a questão de uma avaliação do Araguaia, mas discutimos também a perspectiva futura, nova etapa de luta. A gente tirou ali diretrizes em defesa do fim dos atos de exceção, de uma constituinte, da anistia, enfim, de um conjunto de bandeiras que marcaram a luta democrática naquele período”, lembra Aldo Arantes, que completa 78 anos no próximo dia 20.
Encontrar-se às escondidas era a única forma de poder, com alguma liberdade, trocar ideias sobre política, comenta Haroldo de Lima:
“Um grupo interessado em discutir o Brasil, as suas perspectivas dos seus problemas, esse grupo, para discutir, tinha que viver na clandestinidade, escondido, e sob risco de morte. Era assim que era o clima na época.  A ditadura é um regime atroz. É um regime em que não existia a liberdade de você conversar, de se encontrar. Liberdade de ir e vir. De fazer reunião. De fazer isso que nós estamos fazendo aqui hoje. Uma entrevista como essa que eu estou fazendo aqui agora com você, nem pensar! Isso tudo não só era proibido, como era duramente castigado”.

Prisão, tortura e morte foram os castigos para o jovem economista João Batista Franco Drummond, então com 24 anos. Ele chegara à direção do PCdoB depois de anos de militância nos movimentos estudantis e camponês, além de participação em campanhas eleitorais.
João Batista foi um dos primeiros a sair da reunião. Ele e Wladimir Pomar foram levados no Corcel azul dirigido por Joaquim Celso de Lima e tendo como acompanhante de segurança a veterana comunista e ex-guerrilheira do Araguaia Elza Monnerat, então com 63 anos.
Deixados nas proximidades da avenida Nove de Julho, na região central, os dois são seguidos. João Batista é preso antes de embarcar em um ônibus que o levaria a Goiás, Wladimir chega a perceber a perseguição e tenta escapar, mas acaba preso na avenida Santo Amaro. Os dois são levados para o DOI-CODI, no Paraíso. João Batista é assassinado sob tortura durante na madrugada do dia 16 de dezembro.
Enquanto isso, o Corcel azul tinha voltado para buscar a segunda dupla de dirigentes, Aldo Arantes e Haroldo de Lima –os dois que entrevistei para esta reportagem. Aldo foi preso perto da estação Paraíso, Haroldo foi seguido até a casa que morava e preso na manhã seguinte.
Por volta das seis da manhã do dia 16, Joaquim e Elza fazem a última viagem no carro, levando agora José Gomes Novaes e Jover Telles, o traidor. As forças da repressão deixam os dois escaparem, talvez para tornar mais verossímil a fuga do informante, segundo avalia Aldo Arantes.
Mas Joaquim e Elza não escapam. Na volta para a Lapa, o corcel azul é cercado na avenida Faria Lima por quatro fuscas, com agentes à paisana.
Elza foi encapuzada e jogada dentro de um dos carros. Enquanto era arrancado da direção do Corcel, Joaquim ainda conseguiu ouvir um dos agentes dizer ao rádio: “Tudo limpo. Pode tocar a operação”.
A mensagem, segundo registra o livro “Massacre na Lapa”, de Pedro Estevam da Rocha Pomar, foi o sinal para o tenente-coronel Rufino Ferreira Neves, que comandava o cerco da casa da rua Pio XI, iniciar o ataque à casa da Lapa [que hoje não existe mais; no local foi construído um prédio em que funciona uma clínica médica).
Os 40 agentes policiais e militares, transportados em dez veículos do Exército, não economizaram tiro. Foi bala de metralhadora, fuzil e revólver para todo o lado, destruindo portas e janelas e tirando reboco das paredes.
A cozinheira saiu para a rua e foi imediatamente presa (ao ouvir a voz dela, horas mais tarde, em um dos cubículos do DOI-Codi, Elza Monnerat teve a certeza de que a reunião tinha “caído”).
Arroyo foi fuzilado ao sair do banheiro, Pomar morreu na sala.



“Não tinha um revólver na casa, não tinha nada, absolutamente nada”, afirma Haroldo de Lima, explicando: “A tese que o Partido sustentava naquela época era de que a nossa defesa principal não podia ser a defesa armada. Porque nós não tínhamos correlação de forças para enfrentar. Se tivéssemos que entrar num confronto, num tiroteio, com as Forças Armadas nós perdíamos de longe”.

As Forças Armadas não fizeram nenhum esforço para prender com vida Ângelo Arroyo e Pedro Pomar, acusa Haroldo de Lima.
“Eles poderiam ter feito isso com a maior facilidade, porque eles estavam cercando tudo. Eles tinham toda a força, tinham uma quantidade de gente enorme. Eles eram dois, três. Prendia tudo, ali na hora. Não fizeram nenhum esforço para prender. Foram logo trucidando. Vinte minutos de fuzilaria. Batendo forte para destruir, quase que a casa. Paredes da casa. E os dois morreram de imediato. É a morte premeditada. É a morte planejada. Deliberada, comandada.”
A memória desses combatentes deve ser preservada, e sua luta sempre lembrada por todos nós, afirma Aldo Arantes: “É o momento de você homenagear aqueles que morreram, homenagear aqueles que foram torturados, mas ao mesmo tempo é o momento de reforçar as convicções para a continuidade da luta. Reforçar as convicções, refletir sobre os erros e acertos, para nós estarmos armados ideologicamente, mas estarmos armados também politicamente para operar nessas novas circunstâncias, difíceis, complexas, que impõem para nós tarefas táticas imediatas, mas impões retenção, novo projeto, que possa exatamente incorporar os milhões de brasileiros, um novo momento da luta política brasileira.”
Foi com a luta desses homens e mulheres, lembra Haroldo de Lima, que o Brasil conquistou a democracia: “Foi com muito esforço. Com muito suor, lágrimas e sangue”.

Haroldo de Lima, sobrevivente da reunião do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil realizada em dezmebro de 1976

As conquistas democrática estão hoje novamente ameaçadas, diz Haroldo: “Eu acho que hoje nós temos a tarefa de lutar firme para afastar esse governo golpista que está aí, e lutar por uma eleição direta para presidente da república. Essa é a ideia básica. Às vezes zerar um pouco essa história. Para zerar a história você tem que devolver ao povo a soberania popular. O povo delibera quem vai ser o próximo presidente da República. Nós devemos lutar por isso”.
Relembrar as lutas passadas, como fizemos na caminhada de hoje, é também uma forma de se preparar para as lutas presentes, na opinião de Aldo Arantes:
“Eu acho que é algo extremamente importante. É o momento de você homenagear aqueles que morreram, homenagear aqueles que foram torturados, mas ao mesmo tempo é o momento de reforçar as convicções para a continuidade da luta. Reforçar as convicções, refletir sobre os erros e acertos, para nós estarmos armados ideologicamente, mas estarmos armados também politicamente para operar nessas novas circunstâncias, difíceis, complexas, que impõem para nós tarefas táticas imediatas, de construção de um novo projeto, que possa exatamente incorporar os milhões de brasileiros, um novo momento da luta política brasileira”.


VAMO QUE VAMO!!!


600 aos 60 – etapa 32 – 2016 dez 16

5,71 km caminhados em 1h22min41

Quilometragem acumulada: 143,87 km

Tempo acumulado: 30h08min39









15.12.16

Prefeitura pede desculpas a vítimas da ditadura em SP

Setenta e nove homens e mulheres assassinados por agentes da ditadura militar brasileira foram sepultados em São Paulo, a maioria deles como indigentes, em valas comuns.
“Para esconder as marcas de tortura e a verdadeira causa da morte dos militantes políticos, encenadas como tiroteios ou suicídios, muitas vezes o caixão era entregue à família lacrado e as cerimônias fúnebres acompanhadas pelos agentes da repressão.
Na maior parte das vezes, o corpo sequer era entregue à família, mas sim sepultado clandestinamente nos cemitérios municipais da Prefeitura. Esta Comissão identificou 47 militantes políticos enterrados como indigentes, muitas vezes com identidade falsa, sem o conhecimento de seus familiares, em uma ação coordenada com os órgãos de repressão e o Instituto Médico Legal. Para impedir a descoberta dos crimes, foram feitas alterações nas ruas e quadras do cemitério de Vila Formosa e criada a vala clandestina em Perus, os dois cemitérios onde a maioria dos corpos foram sepultados. Tais ações impedem até hoje a localização e identificação de 17 vítimas da ditadura sepultadas na capital, como apontam os documentos oficiais.”
O texto acima faz parte do pronunciamento de Tereza Lajolo, presidente da Comissão da Memória e da Verdade da Prefeitura de São Paulo, realizado durante a cerimônia oficial de apresentação dos resultados do trabalho ao prefeito Fernando Haddad.

O evento foi realizado no auditório da Prefeitura de São Paulo, no histórico prédio Matarazzo, no viaduto do Chá, que foi o destino de minha caminhada de hoje, trigésimo-primeiro dia de minha jornada para tentar completar um percurso de seiscentos quilômetros até 14 de fevereiro, quando completo sessenta anos.
Tive a alegria de mais uma vez encontrar em um palco da defesa dos direitos humanos o ex-líder sindical, jornalista e escritor Audálio Dantas, que integrou a comissão.


Também encontrei  o eterno senador por São Paulo, Eduardo Suplicy, o ex-deputado e superativista Adriano Diogo, membro da comissão, e muitos outros ex-presos políticos, lutadores que não abandonam o campo e seguem firmes no combate por um mundo melhor.
A cerimônia culminou com o discurso de Fernando Haddad, que fez o pedido de desculpas oficial às vítimas e aos familiares de vítimas da ditadura militar em São Paulo.
O discurso de Lajolo fez um breve resumo das conclusões da comissão; por isso, faço dele a conclusão desta mensagem.
Acompanhe, ao longo do texto, entradas com pequenos vídeos com depoimentos de cada um dos membros da Comissão da Memória e da Verdade; também filmei a fala de Haddad.
Segue, então, o pronunciamento de Tereza Lajolo.

“Para que o país alcance a plena democracia é necessário que a verdade sobre sua história seja conhecida, bem como a justiça e as reparações sejam feitas. As violações aos direitos humanos cometidas pelo Estado na ditadura militar começaram a ser denunciadas ainda durante a repressão. Desde então, uma série de publicações, ações judiciais e Comissões de Inquérito buscaram investigar o que aconteceu neste período. A instalação da Comissão Nacional da Verdade, em 2012, foi um marco, e revelou um capítulo importante da história do nosso país e deu um novo impulso à busca pela verdade.
A Comissão da Memória e Verdade da Prefeitura de São Paulo nasce neste contexto, com a missão de compreender o papel da Prefeitura de São Paulo na repressão, ao colaborar com a organização e manutenção dos aparatos da repressão, assim como investigar os crimes cometidos contra agentes públicos municipais.
Os trabalhos desta Comissão começaram em 25 de setembro de 2014 e se estenderam por 27 meses – os dois anos previstos pela lei nº 16.012/2014, que a criou, somados à uma prorrogação de 3 meses para a finalização do relatório que hoje é entregue à Prefeitura e à sociedade. Em sua primeira formação, foi composta pelos membros Audálio Dantas, Cesar Cordaro, Fermino Fechio, Fernando Morais e Tereza Lajolo. Com a renúncia de Cesar Cordaro e Fernando Morais, foram nomeados membros da Comissão Adriano Diogo, em abril de 2015, e Camilo Vannucchi, em fevereiro de 2016.


Ao longo do mandato desta Comissão, foram realizadas 14 audiências públicas, além de oitivas e extensas pesquisas em arquivos da Prefeitura, da Câmara Municipal, da Alesp, no Arquivo Nacional, entre outros tantos.
Falar em violações aos direitos humanos imediatamente remete às mortes, torturas, desaparecimentos e ocultação de cadáveres cometidos durante a ditadura militar. Mas além de investigar os episódios e denúncias relacionadas às estas graves violações, esta Comissão também se debruçou sobre as violações aos direitos, como demissões, perseguições, aposentadoria forçada, associadas ao modus operandi da ditadura e praticadas pela Prefeitura de São Paulo.
A pesquisa ao longo desses dois anos revelou a participação e a colaboração da Prefeitura Municipal com o sistema repressivo. Desde o golpe de 1964, uma série de atos institucionais e decretos foram criados para inibir e perseguir quem lutava contra a ditadura, as organizações políticas, movimentos sociais e os servidores municipais.


 O sistema da ditadura se estrutura e passa a trabalhar de forma totalmente articulada em 1970, com a criação do Sistema de Segurança Interna. Neste momento, a Prefeitura estreita a contribuição com aparelhos como o Doi-CODI, o Deops, e todo o mecanismo da repressão. A investigação desta Comissão revelou um constante monitoramento praticado pela Prefeitura, além da perseguição aos sindicatos e trabalhadores, aposentadorias forçadas e repressão aos movimentos sociais. As violações extrapolam o período da ditadura militar. Conforme determinou a lei que criou esta Comissão, o período entre 1985 e 1988 também é alvo de nossas investigações.


Em 1985, foram realizadas as primeiras eleições municipais, que escolheram o ex-presidente Jânio Quadros como prefeito de São Paulo. Seu governo, no entanto, foi marcado por violações de direitos humanos e repressão política e social, claramente influenciadas pela doutrina de segurança nacional. O período foi marcado pela criação da Guarda Civil Metropolitana, que participou da repressão aos movimentos sociais, além das mais de mil demissões de funcionários públicos grevistas.
Neste sistema coordenado com as esferas federal e estadual, a Prefeitura colaborou com a ocultação de cadáveres nos cemitérios municipais de São Paulo, subordinados ao Serviço Funerário do Município. As pesquisas desta Comissão revelaram que foram sepultadas na capital 79 vítimas da ditadura militar. Para esconder as marcas de tortura e a verdadeira causa da morte dos militantes políticos, encenadas como tiroteios ou suicídios, muitas vezes o caixão era entregue à família lacrado e as cerimônias fúnebres acompanhadas pelos agentes da repressão.
Na maior parte das vezes, o corpo sequer era entregue à família, mas sim sepultado clandestinamente nos cemitérios municipais da Prefeitura. Esta Comissão identificou 47 militantes políticos enterrados como indigentes, muitas vezes com identidade falsa, sem o conhecimento de seus familiares, em uma ação coordenada com os órgãos de repressão e o Instituto Médico Legal. Para impedir a descoberta dos crimes, foram feitas alterações nas ruas e quadras do cemitério de Vila Formosa e criada a vala clandestina em Perus, os dois cemitérios onde a maioria dos corpos foram sepultados. Tais ações impedem até hoje a localização e identificação de 17 vítimas da ditadura sepultadas na capital, como apontam os documentos oficiais.


A condição de indigência, que foi usada para desaparecer com o corpo de opositores políticos na ditadura, até hoje impede que muitas famílias tenham o direito de sepultar seus parentes. Um levantamento do Ministério Público Estadual identificou que muitos corpos são enterrados como desconhecidos nos cemitérios municipais apesar de dados que permitam sua identificação. Tal recurso é uma ameaça especialmente contra a população que vive na periferia e é alvo da Polícia Militar, que pode usar a condição de indigente para ocultar seus crimes, como fazia a ROTA na década de 80.
Por essa razão, o conhecimento do passado é tão importante para a construção da democracia. A pergunta que temos que fazer é como vamos trabalhar para que as violações cometidas durante o período da ditadura militar nunca mais se repitam.“


Ao que eu digo:
DITADURA NUNCA MAIS!!!
VAMO QUE VAMO!!!


600 aos 60 – etapa 31 – 2016 dez 15

5,30 km caminhados em 1h02min59

Quilometragem acumulada: 138,16 km

Tempo acumulado: 28h45min58










14.12.16

“Dom Paulo foi uma estrela, sempre apontando caminhos”, diz Margarida Genevois

Dom Paulo Evaristo Arns morreu na manhã de hoje, aos 95 anos.
No comunicado do falecimento, o cardeal Odilo Pedro Scherer diz que dom Paulo “generosamente” dedicou sua vida “aos irmãos neste mundo”.
Nessa entrega, o cardeal Arns foi exemplo de coragem, altivez, determinação, fraternidade –um monte de palavras, e todas elas cabem em uma só: amor.
Enfrentou a ditadura militar de peito aberto e coração tranquilo; na redemocratização, foi sempre um companheiro fraterno e militante dos movimentos populares, um incentivador de ações para a construção de um mundo mais justo, livre e igualitário.


No início deste ano, quando desenvolvi meu projeto “Corrida por Manoel”, homenagem que fiz à memória de Manoel Fiel Filho, tive o prazer e a honra de entrevistar Margarida Genevois, pioneira da campanha pela anistia.
Nossa conversa foi emocionada e emocionante, e eu registro um pouco dela no texto publicado no penúltimo dia da “Corrida Por Manoel” –CLIQUE AQUI para ler a íntegra.


Margarida –também ela uma guerreira generosa e inquebrantável—diz o seguinte do trabalho do cardeal durante a ditadura militar: “As coisas no Brasil teriam sido muito piores se não fosse dom Paulo, porque ele era um homem de coragem, enfrentava os militares, não tinha medo e apoiava aqueles que se comprometiam com a paz e com a justiça”.
Mais, muito mais, continua Genevois, resumindo tudo numa só frase: “Ele era como uma estrela, mostrando o caminho para todos que se aproximavam dele”.
Ao que eu digo:
DOM PAULO EVARISTO ARNS, QUERIDO CARDEAL ARNS DO POVO BRASILEIRO, PRESENTE, AGORA E SEMPRE!!!

VAMO QUE VAMO!!!


600 aos 60 – etapa 30 – 2016 dez 14

7,61 km caminhados em 1h32min46

Quilometragem acumulada: 132,86 km

Tempo acumulado: 27h42min59



13.12.16

Projeto de cientista brasileiro faz paralítico dar primeiros passos

Milagre!!! Milagre!!! Milagre!!!
Durante minha caminhada de hoje, ainda passava pela minha mente a lembrança de trechos de vídeo a que assisti na noite de ontem.
Era coisa que, se religioso fosse, poderia chamar de milagre, “um acontecimento dito extraordinário que, à luz dos sentidos e conhecimentos até então disponíveis, não possuindo explicação científica ainda conhecida, dá-se de forma a sugerir uma violação das leis naturais que regem os fenômenos ordinários”, na definição encontra na Wikipedia.
Crentes em seres superiores que organizam nosso universo acreditam que milagres são obra de um ser superior, criador do universo; eventualmente, ocorrem por intercessão de auxiliares desse criador.
Quando eu era pequeno, meu pai costumava ler a Bíblia para mim. Ainda hoje algumas das histórias estão guardadas nos confins de minha memória. Por isso, quando vi o tal filme, logo me lembrei de uma passagem bíblica.
Está registrada no Evangelho de João e se refere à cura de um sujeito que não andava, que estava “enfermo havia 38 anos”, de acordo com o lá escrito. Pois eis que Jesus perguntou ao cara se ele queria ficar curado e, ante resposta afirmativa, ordenou:
 “Levanta, toma teu leito e anda.”
E lá se foi o ex-paralítico lépido e fagueiro.
Pois não é que homens como nós estão conseguindo realizar milagre semelhante?
Não há nenhum ex-paralítico andando pela 25 de Março em busca de mimos natalinos, mas um pequeno número de homens e mulheres que até dois anos atrás eram completamente paralisados da metade do peito para baixo já conseguem comandar alguns movimentos das pernas, até dar passos com ajudas especiais.
Alguns voltaram mesmo a ter controle de seus movimentos intestinais; uma jovem senhora ficou tão empolgada com os avanços, com a melhora de sua qualidade de vida, com a volta da esperança, que resolveu engravidar.
São resultados do trabalho comandando pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, um dos mais aclamados pesquisadores da atualidade, um apaixonado pelo Brasil e pela construção de nossa soberania.
Eu tive o prazer e a honra de ajudar a divulgar palestra realizada em São Paulo por Nicolelis, que é paulistano formado na USP, membro das academias Francesa, do Vaticano e Brasileira de Ciências. Recebeu mais de 30 prêmios internacionais. Foi eleito um dos 25 cientistas mais importantes do mundo pela revista “Scientific American”, em 2004. Em 2015, foi apontado como um dos cem grandes pensadores globais pela revista americana “Foreign Policy”.

O cara é um gênio.

O melhor é que ele fale por si mesmo. Vale a pena assistir a cada minuto da palestra dele, realizada no Sedes Sapientiae, que eu transmiti ao vivo e agora coloco aqui na íntegra para você ter a oportunidade de conhecer mais sobre o trabalho desse grande brasileiro.



VAMO QUE VAMO!!!



600 aos 60 – etapa 29 – 2016 dez 13

6,12 km caminhados em 1h10min48

Quilometragem acumulada: 125,25 km


Tempo acumulado: 26h10min13

12.12.16

Auditoria computadorizada aponta erro em conta de corredor

Errei.
Não sei quando, não sei onde, mas hei de descobrir. O que importa agora é corrigir o erro e começar de novo com a mente aberta e o coração tranquilo.
Ainda bem que a falha não afeta minha caminhada. Tenho conseguido realizar jornadas de quatro quilômetros e até mais, a cada dia, sem sentir dor. Não posso saber com certeza, mas espero que o corpo, ainda que velho, esteja trabalhando firme na recuperação de meu fêmur machucado.
Pobre fêmur!!!
Também não tenho abusado nas escadas: descer era um sofrimento, uma dor a cada passo. Aprendi com o fisioterapeuta Marcelo Semiatzh: subir escadas dando o primeiro passo com a perna boa, descer escadas dando o primeiro passo com a perna machucada; se necessário, descer e subir um degrau de cada vez.
São pequenos truques no trato da lesão que contribuem para a melhoria da qualidade da caminhada.
Aliás, é bom dizer que a caminhada também pode ser lesiva: a gente fica mais tempo com o pé no chão do que quando corremos. Se ficarmos repetindo isso uma ou duas horas por dia, dia após dia, haverá consequências.
Eu guardo no meu pé esquerdo uma lembrança disso: uma inflamação entre o segundo dedo e o terceiro dedo foi consequência de quarenta dias seguidos de caminhada no verão de 2013/2014. De vez em quando, ela avisa que está lá, e eu tenho de tomar providências para proteger o local.
O importante é chegar a quatro de janeiro, quando terei nova consulta com o ortopedista, sem dores maiores. E também é importante conseguir o máximo possível de quilometragem acumulada sem prejudicar o processo de recuperação.
Estou indo bem: até ontem, conseguira acumular o cabalístico número de 111,11 quilômetros em 27 etapas deste projeto rumo a completar seis quilômetros até o dia de meu aniversário, 14 de fevereiro. Já somara também mais de um dia inteiro de caminhada: 24 horas, seis minutos e  alguns segundos, segundo os meus cálculos.
Foi aí que eu errei: nos cálculos.
A cada dia, somo os quilômetros percorridos. Faço também a adição dos minutos empregados em cada treino. Em geral, sou bom em matemática, mas nunca é demais conferir cálculos, mormente quando há tantas filigranas e a adição não é convencional, como no processo de soma de segundos e minutos.
Para a conferência, fui buscar ajuda computadorizada, utilizando recurso do programa que registra os dados apurados por meu relógico com GPS.
No final da tarde de ontem, fiz o balanço da quilometragem e do tempo total empregado cá neste projeto: 115,17 quilômetros, informou o programa. Distância percorrida em 24 horas, sete minutos e quatro segundos.
Ou seja: os números do computador não batiam com os dados que eu tinha apurado.
Errei.
Menos mal que o erro foi contra mim: estava registrando uma quilometragem inferior à efetivamente inferior à efetivamente percorrida.
Em algum momento, devo ter repetido dado na página ou deixado de somar algum trecho. Para descobrir isso será necessária nova auditoria. Por enquanto, para que as coisas voltem a ficar em ordem, registro hoje a quilometragem e o tempo somados pelo programa de estatísticas baseadas nos dados do GPS.

No total, foram trinta atividades computadas pelo sistema, em 28 etapas –em dois dias, fiz duas caminhadas. Com os 3,96 km de hoje, somei 119,13 km, percorridos ao longo de 24 horas, 59 minutos e 25 segundos.  
VAMO QUE VAMO!!!


600 aos 60 – etapa 28 – 2016 dez 12

3,96 km caminhados em 52min21

Quilometragem acumulada: 119,13 km

Tempo acumulado: 24h59min25


11.12.16

Repórter ganha folga; corredor segue em busca dos 600 km

Desculpe aí, prezado leitor, querida leitora, mas hoje vamos dar uma folguinha ao jornalista Rodolfo Lucena, permitindo que o cara passe um dia sem fazer registros de maior monta cá neste espaço.
Já o corredor Rodolfo Lucena segue seu périplo sem interrupção: há que caminhar um pouco a cada dia, para acumular quilômetros na jornada rumo a completar seiscentos quilômetros até o dia 14 de fevereiro.
Grato pela compreensão.

VAMO QUE VAMO!!!



600 aos 60 – etapa 27 – 2016 dez 11

3,81 km caminhados em 52min03

Quilometragem acumulada: 111,11 km

Tempo acumulado: 24h06min45


10.12.16

Religiões se unem em ato em defesa dos direitos humanos

Conheço muito pouco dos intestinos das religiões. Como qualquer um que leia jornais, acompanhe o noticiário e procure conversar com quem saiba mais sobre o mundo, tenho alguma noção dos caminhos e descaminhos políticos de cada uma e sou fã do papa Francisco.
Com esses parcos conhecimentos, minha impressão é de que, em grande parte de seu tempo útil, as diversas denominações religiosas têm entre si certa atitude beligerante, cada qual tentando cooptar para si a crença de mais fiéis.
Para usar uma palavra da moda, cada uma tem sua narrativa particular sobre origens do universo e existência de um ou mais seres superiores que comandam as engrenagens do sistema. E cada uma trata de tentar fazer com que sua narrativa seja a preponderante, a hegemônica.
Hoje não foi assim. Num belo exemplo de irmandade e fraternidade, representantes de diversas denominações religiosas participaram de um culto ecumênico para celebrar o Dia Universal dos Direitos Humanos.
A cerimônia, organizada pelo Coletivo Democracia Corintiana e pela Comissão de Justiça e Paz, foi realizada na catedral da Sé, destino de hoje de minha caminhada, que também homenageou o aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Direitos tão agredidos nos tempos em que vivemos, no mundo e no Brasil. Essa foi a denúncia presente nos depoimentos de todos os celebrantes do ato –representantes do catolicismo, do islamismo, do  judaísmo e de religiões de matriz africana; um pastor do grupo Evangélicos Pela Democracia também deveria participar, mas não conseguiu chegar a tempo.
O discurso do padre Jaime Crowe, que nesta segunda-feira recebe o Prêmio Dom Paulo Evaristo Arns de Direitos Humanos, foi o mais contundente. Denunciou as mortes da população de rua e os ataques da polícia à juventude, especialmente os jovens “pobre, pretos e periféricos”.
Também apontou que a “PEC da Morte” atenta contra os direitos mais elementares dos cidadãos brasileiros.
De fato, a proposta de emenda constitucional feita pelo governo golpista do Usurpador Michel Temer que congela investimentos em saúde e educação pelos próximos vinte anos já foi considerado crime até pela ONU.
Em nota distribuída ontem, o relator especial daa Nações Unidas para extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alson, diz que o efeito “inevitável” da medida será o prejuízo aos mais pobres nas próximas décadas.
Afirma que, se adotada, “vai atingir com mais força os brasileiros mais pobres e mais vulneráveis, aumentando os níveis de desigualdade em uma sociedade já extremamente desigual e, definitivamente, assinala que para o Brasil os direitos sociais terão muito baixa prioridade nos próximos vinte anos”.
Para piorar as coisas, não há evidência de que as medidas venham a atingir os resultados desejados. Ao contrário, segundo diz Alson: “Estudos econômicos internacionais, incluindo pesquisas do Fundo Monetário internacional, mostram que a consolidação fiscal tipicamente tem efeitos de curto prazo, reduzindo a renda, aumentando o desemprego e a desigualdade de renda. A longo prazo, não existe evidência empírica que sugira que essas medidas alcançarão os objetivos sugeridos pelo Governo”.
O povo segue lutando. Enquanto isso, é bom sonhar.
A bela imagem de São Paulo depois da chuva ajuda, assim como a maravilhosa poesia de Thiago de Mello. O texto que reproduzo a seguir foi escrito no exílio, em Santiago do Chile, logo depois do golpe militar que, em 1964, atacou a democracia, a vida e a liberdade dos brasileiros.



ESTATUTO DO HOMEM

   (Ato Institucional Permanente)
 
                                          
 
    Artigo I
 
  
Fica decretado que 

agora vale a verdade,

agora vale a vida,

e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida 

verdadeira.
 
 
   Artigo II

   Fica decretado que todos os dias da 

semana,

   inclusive as terças-feiras mais cinzentas,

   têm direito a converter-se em manhãs 

de domingo.
 
 
   Artigo III
 
   Fica decretado que, a partir deste 

instante,

   haverá girassóis em todas as janelas,

   que os girassóis terão direito

   a abrir-se dentro da sombra;

   e que as janelas devem permanecer, o 

dia inteiro,

   abertas para o verde onde cresce a 

esperança.
 
 
   Artigo IV
 
   Fica decretado que o homem

   não precisará nunca mais

   duvidar do homem.

   Que o homem confiará no homem

   como a palmeira confia no vento,

   como o vento confia no ar,

   como o ar confia no campo azul do céu.


 
           Parágrafo único:
 
           O homem, confiará no homem

           como um menino confia em outro 

menino.
 
 
   Artigo V
 
   Fica decretado que os homens

   estão livres do jugo da mentira.

   Nunca mais será preciso usar

   a couraça do silêncio

   nem a armadura de palavras.

   O homem se sentará à mesa

   com seu olhar limpo

   porque a verdade passará a ser servida

   antes da sobremesa.
 
 
   Artigo VI
 
   Fica estabelecida, durante dez séculos,

   a prática sonhada pelo profeta Isaías,

   e o lobo e o cordeiro pastarão juntos

   e a comida de ambos terá o mesmo 

gosto de aurora.

 
 
   Artigo VII

   Por decreto irrevogável fica estabelecido

   o reinado permanente da justiça e da 

claridade,

   e a alegria será uma bandeira generosa

   para sempre desfraldada na alma do 

povo.
 
 
   Artigo VIII
 
   Fica decretado que a maior dor

   sempre foi e será sempre

   não poder dar-se amor a quem se ama

   e saber que é a água

   que dá à planta o milagre da flor.

 
 
   Artigo IX

   Fica permitido que o pão de cada dia

   tenha no homem o sinal de seu suor.

   Mas que sobretudo tenha

   sempre o quente sabor da ternura.
 
 
   Artigo X

   Fica permitido a qualquer pessoa,

   qualquer hora da vida,

   o uso do traje branco.
 
 
   Artigo XI
 
   Fica decretado, por definição,

   que o homem é um animal que ama

   e que por isso é belo,

   muito mais belo que a estrela da manhã.

 
 
   Artigo XII
 
   Decreta-se que nada será obrigado

   nem proibido,

   tudo será permitido,

   inclusive brincar com os rinocerontes

   e caminhar pelas tardes

   com uma imensa begônia na lapela.


 
           Parágrafo único:
 
           Só uma coisa fica proibida:

           amar sem amor.
 
 
   Artigo XIII
 
   Fica decretado que o dinheiro
   
   não poderá nunca mais comprar
   
   o sol das manhãs vindouras.
   
   Expulso do grande baú do medo,
   
   o dinheiro se transformará em uma 

espada fraternal

   para defender o direito de cantar

   e a festa do dia que chegou.
 
 
   Artigo Final. 
   
   Fica proibido o uso da palavra liberdade,

   a qual será suprimida dos dicionários

   e do pântano enganoso das bocas.

   A partir deste instante

   a liberdade será algo vivo e transparente

   como um fogo ou um rio,

   e a sua morada será sempre

   o coração do homem.



VAMO QUE VAMO!!!





600 aos 60 – etapa 26 – 2016 dez 10

6,36 km caminhados em 1h25min09

Quilometragem acumulada: 107,30 km

Tempo acumulado: 23h14min42